Mercado carioca entra em nova fase e aposta no residencial
Valor Econômico, Renata Batista, 21/mar
Depois de muita euforia e de um boom de lançamentos nos últimos anos, o mercado imobiliário carioca está se ajustando a um novo momento. Construtoras que se dedicaram exclusivamente ao mercado comercial, principalmente de hotéis e unidades corporativas, estão olhando com maior atenção o segmento residencial e oportunidades pontuais no industrial. O eixo de expansão da cidade também parece estar mudando. A Barra, menina dos olhos do setor nos últimos anos, deve entrar em um período de estagnação tanto no residencial quanto no comercial.
Atentas ao incômodo dos cariocas com os problemas de trânsito crescentes, as construtoras estão de olho nas oportunidades na região central da cidade e no entorno dos novos modais de transporte que atravessam, principalmente, os bairros da Zona Norte. A renovação de contratos de locação comerciais também deve favorecer a região central.
É um momento que não aceita desaforo. Existem nichos importantes, como imóveis menores, para executivos, mas tem de fazer bem feito", diz Guilherme Britto de Macedo Soares, diretor da JLL (antiga Jones Lang La Salle), empresa especializada na gestão de imóveis corporativo que reuniu na semana passada mais de 100 pessoas entre investidores, proprietários e locatários, todos interessados em entender o que acontece com o mercado.
Para a JLL, a taxa de vacância para imóveis comerciais em torno de 14% não é um problema, inclusive porque esse índice não se repete em todas as regiões da cidade nem em todos os segmentos. A absorção líquida dos empreendimentos que estão sendo entregues diminuiu, mas é conjuntural, avaliam. "Estamos em um momento de entregas. A taxa de vacância aumenta por isso e pelo movimento de grandes grupos empresariais da cidade, mas não é igual em todas as regiões nem para todos os imóveis. No Centro, em imóveis comerciais classe AAA, a taxa é de 3%", resume outra diretora da JLL, Mônica Barg. Para imóveis de uso industrial, na periferia da cidade o índice é até menor. Há fila até para imóveis já contratados.
"Tivemos uma procura enorme por um de nossos centros de distribuição, na Avenida Brasil, só porque saiu uma notícia no jornal falando que o locatário havia entrado com pedido de recuperação judicial", conta o executivo de uma empresa de logística que participou do evento da JLL. "Temos uma demanda enorme para imóveis com esse perfil no Rio", diz.
Segundo Mônica, além do grupo EBX, de Eike Batista, que desocupou o edifício Serrador, no centro da cidade, Vale e Petrobras também estão mudando sua estratégia para o setor. Antes, com a pressão nos preços e na oferta, a estratégia de ambas era manter uma reserva de imóveis alugados, que iam ocupando ao longo do tempo. Agora, adotaram uma gestão mais conservadora e muitos desses imóveis foram entregues.
"Mas ainda há demanda para o Centro e para imóveis de padrão mais elevado porque as empresas que fecharam contrato há três anos, no pior momento, e por isso tiveram que ir para a Barra ou para imóveis de menor padrão, estão em fase de renovação e estudam as oportunidades para uma mudança", conta Mônica. Segundo ela, existem hoje cerca de 30 mil metros quadrados com perspectiva de mudança na cidade.
Essa é a aposta de Ana Carmem Alvarenga, diretora da Tishman Speyer para o Rio. A empresa colocou no mercado este mês as primeiras unidades comercial na região do Porto - o Port Corporate Tower. E se prepara para fazer mais um lançamento corporativo - o Pátio Marítimo - e está negociando terreno e Certificados de Ampliação do Potencial Construtivo (Cepacs) com a Caixa para um empreendimento misto.
"Existe uma demanda reprimida muito grande no Centro e na Zona Sul que pode ser atraída para o Porto. Temos funcionários expatriados que tiveram de ver mais de 40 imóveis na Zona Sul para conseguir alugar um", diz Ana, cuja empresa trabalha apenas com administração e aluguel e ainda não havia investido no segmento residencial no Rio pela dificuldade de encontrar projetos adequados a esse perfil.
A Caixa, que comprou todos os Cepacs do Porto da prefeitura em uma transação para viabilizar as obras de infraestrutura na região, informa que mais da metade dos certificados já foram negociados, embora apenas um leilão tenha sido realizado. As operações estão sendo fechadas por meio de venda direta e até de permuta por unidades dos empreendimentos.
De acordo com fontes do setor, alguns projetos na região do Porto Maravilha que já haviam sido apresentados como exclusivamente corporativos estão sendo ajustados para uso misto. A alta dos juros e o maior conservadorismo dos investidores estaria contribuindo para isso. Como no residencial, os incorporadores têm fontes alternativas e mais baratas de financiamento, a operação está mais atrativa. "A venda também é diferenciada. O incorporador vende no lançamento e já começa a receber. Não precisa esperar a entrega", diz uma font.
Um empreendimento residencial na região também precisa de metade das Cepacs exigidas para um comercial do mesmo tamanho. É outro bom incentivo", completa Ana Carmem. Ela avalia que as primeiras unidades residenciais na região devem ser menores, mas voltadas para a classe média. "Imóvel líquido no Rio é o de menos de R$ 750 mil. Não importa a metragem", afirma o diretor da construtora Leducca, Paulo Marques.